quarta-feira, 25 de agosto de 2010

No "front" (Nu frontal).

Afrouxar esse nó; deixar
de ser frouxo de uma vez
por todas; provar, por si
mesmo, o doce gosto da fiel
continuação do esqueleto
que mal saiu do papel; assinar
a reconstrução (sem fim) da natural
estrutura, defeituosa, mas, desde já,
dura na queda, madura, segura da meta.

Ativar a briosa faceta, dolorosa
negociata com a vertente mais sombria
da psiquê; conquistar as petrificadas
partes da fatal morosidade do orgulho
próprio, momento final da enchente
de vazio significativo, indicativo
de roteiro errado; faceiro, falso recado
escrito em agradáveis signos de um passado
distante, remoto e sempre insistente.

Encarar de frente; combinar as cores;
conquistar melhores causas; abraçar
mais nobres sonhos; beijar a lona,
por vezes; acariciar o destino;
trepar com força na vida, no topo;
aproveitar a caminhada; pegar ritmo;
sentir o deleite de ser, existir; ralar,
transpirar, imaginar; ignorar as dores, gritar,
cantar; (re)conhecer vivos amores; gozar e gozar.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Eu e tu.

Danem-se todos os prólogos,
os monólogos, os jogos de bola,
os colchões de espuma, de mola,
as paixões de esmola, reuniões
da turma da escola, a fala
que não cola, a conversa
que não desembola, a dor
que me assola, a mulher
que me amola, que me faz
gastar a sola, pegar insolação.

Fodam-se as morenas, as loiras,
as negras, as mulatas, as ruivas,
as serenas, agitadas, as ingratas,
as carinhosas, dispersas, as atentas,
as sedentas, as frígidas, apaixonadas,
desencanadas, encalhadas, as carentes,
as lunáticas, as enfáticas, as vagas,
as vagabundas, as puras, as duras,
as baratas, as caras, as pagas,
as rasas, profundas e vazias.

Pouco me afligem os chefes,
os mestres, os cheques, os leques
de opções inconvenientes, as declarações
intransigentes, os corações descontentes,
toda essa gente, os pilares, andares, elevadores,
impossíveis amores, incompreensíveis louvores,
os rumores de má fé, os senhores, a elite,
a ralé, a suíte, a trepada e o café da manhã
na cama, toda essa fama, essa dama
sorridente, esse drama inconstante.

Pouco me ocupo com as revistas
na estante, os egoístas, os tratantes,
os bairristas, os viajantes, os motoristas,
os comandantes, os passageiros, os otários,
os faceiros, os extraordinários, os ignorantes,
os bancários, os banqueiros, os proprietários
de banca de jornal, os pensadores, os proletários,
os criativos, os maconheiros, os esportistas,
os sedentários, os empresários, os traficantes,
os boleiros, os jornalistas, radialistas, comentaristas.

Muito me importo comigo, meu umbigo, meu abrigo,
com o perigo nas ruas, contigo e as suas
palavras, com eles ali e elas aqui, conosco, convosco,
com aqueles ouvindo, sorrindo, aplaudindo, assistindo
tevê, com quem acredita no que lê nas mesmas revistas,
com quem leva a sério as entrevistas mal-dadas,
as ativistas peladas, os ciclistas, as pedaladas
do robinho, do neymar e do ganso, com meu descanso,
meu propenso descaso, meu intenso apreço pelo cru,
nu, inocente, coerente, aparente... Eu e tu.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Peleja-cabeça.

São bem-entendidos que discutimos
em rodas de papo-furado; rosto
a rosto lavado; levado na lábia
da (suposta) sábia persona; astuta
proposta de mútua paz interior.

Os mal-explicados assuntos, jogados
em esfumaçados verbetes, são fiados
lembretes que jamais serão honrados;
serão usados, cuspidos e pisados
em tempo real, sem falso pudor.

Descalço, o temor de furar a sola (do pé),
pisar na bola, é maior, e o pior
calor de todos é o frio na espinha
da consciência; quando já está feito,
não tem jeito, não tem peito que não doa.

Ficar à toa é a ciência de estar
o tempo todo pronto a não fazer nada
de chato, de bom ou proveitoso; é ficar
manhoso a toda obrigação; é estreitar
toda ligação afetiva barata e ôca.

O movimento da boca assume papel-chave;
bons gostos, bolas dentro, p'ra fora,
na trave e comentários diversos; alguns
versos ao quadro, alguns tratos
mal-fechados, muitos olhos bem abertos.

De certo modo, nada errado entre aqueles
que se propuseram a jogar, olhar,
comentar o jogo rolando, o pau comendo,
cantando no meio-de-campo, no núcleo
do círculo central da pegada peleja.

A cereja do bolo é cefaléia proveniente
do coquetel de orgulho, dissimulação,
culpa, perdão e urgência; a carência
fica p'ra escanteio; e o receio de perder
jogando bem, não existe ou já ficou p'ra trás.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Aniversário.

Neste salão só há espaço
para o sincero desembaraço;
que o laço que nos une, assim
espero, seja imune ao cansaço;
que os estilhaços das quebradas
taças não machuquem nossas mãos.

Os vãos impulsos de euforia
são multicoloridos respingos pueris
nesse quadro pintado a incontáveis toques;
individuais enfoques do mesmo tema;
que o brilho do verniz desse poema
conserve em bom lugar tudo o que passou.

Um show cantado, falado, tocado,
apreciado e assistido por todos
os lados; apresentado em vários palcos;
em que os normais obstáculos
técnicos pouco valor tiveram,
em que prevaleceram calor e furor.

O amor estava presente; os objetos
trazidos como lembranças representaram
alianças imersas em carinho e respeito;
diversas personagens que levarei
para sempre em meu peito nas andanças
que, daqui pra frente, me embrenharei.

Como nada é perfeito, nem tudo ocorre
do planejado jeito, e o inesperado
efeito dessas mazelas, quando há
certeza do que se pretende, é a clareza
invadindo as janelas dos vindouros dias,
em que almas vazias não mais terão vez.

A fluidez do que se vê e sente
é a maior prova de que é corrente
a mesma visão; que todos retornarão
a este chão, e que outros ausentes
se sintam contentes e estimulados
a fazer parte do que ainda há por vir.