Pode ser mais doído o
ódio moído; o incenso
de sangue; o mangue de
justiça; a preguiça da
certeza.
A garrafa sobre
a mesa; o pudim em pedaço;
o vintém de recalque; o
decalque de raiz; a pessoa
mais feliz.
O desconforto
de ontem; o perdão de outrora;
o padrão de reação; o caldo,
o tempero e o grão; a inércia
do conhecido.
O contracheque
mal-vencido; a derrota
com sabor; o machucado
sem dor.
estava lendo seu blogue tem uma duas semanas e para maturar as ideias e nao ficar pedante na interpretação automatica, dei um tempo e esqueci; voltei para poder ler como se fosse meu [e em algum egoísmo que só se declara para parecer bom moço]... gostei muito de como trabalha nas palavras (sentido-sintaxe-som) a ação e a reação em gradação (também a degradação)... interessante como alcançamos muito mais e além do que uma mera sociedade de poetas mortos...
ResponderExcluir"o mangue da justiça; a preguiça da certeza."
"o vintém de recalque; o decalque de raiz; a pessoa mais feliz."
"o padrão de reação; o caldo, o tempero e o grão; a inércia do conhecido."
"Tenho tudo em minhas mãos, tão tuas; mãos à obra [...] Tragicamente, de tão nossas, nunca minhas, nunca tuas."
"O mês - de três semanas - figuras, agruras humanas; manias vão pelo ralo. O mesmo canto, um grito esparso no lugar (in)comum; só mais uma figura, mais um. São dois, três sustos; são justos gritos, doces figuras, agruras vão pelo ralo."
isso me lembrou o poema de frank o'hara que sempre buscou a causa das coisas
assim como no brasil murilo mendes e mais de modo formal joão cabral de mello
Neto
frank o'hara - digression on number 1, 1948[excerto]
I am ill today but I am not
too ill. I am not ill at all.
It is a perfect day, warm
for winter, cold for fall.
[...]
I am tired today but I am not
too tired. I am not tired at all.
There is the Pollock, white, harm
will not fall, his perfect hand
and the many short voyages.
murilo mendes - somos todos poetas
Assisto em mim a um desdobrar de planos.
as mãos vêem, os olhos ouvem, o cérebro se move,
A luz desce das origens através dos tempos
E caminha desde já
Na frente dos meus sucessores.
[...]
Pelos gritos isolados que não entraram no coro.
Sou responsável pelas auroras que não se levantam
E pela angústia que cresce dia a dia.
João Cabral de Melo Neto - Fábula de um Arquiteto[excerto]
de abrir; ou como construir o aberto;
construir, não como ilhar e prender,
nem construir como fechar secretos;
construir portas abertas, em portas;
casas exclusivamente portas e tecto.
O arquiteto: o que abre para o homem
(tudo se sanearia desde casas abertas)
portas por-onde, jamais portas-contra;
por onde, livres: ar luz razão certa.
Mas tem algo que não soube definir, talvez são aqueles espaços mentais dentro de nós que inventamos para podermos sair de coisas que são tão nossas e proximas mas com jeitão de cadeia... ponto em que a dúvida é uma sobrevida, por cima, que ainda há de se apresentar depois de cairmos de duzentos sonhos, não num vácuo mas talvez na contemplação serena de tudo que se apresenta... um belo às na manga
"A gente não sabe,
mas tudo que abre
uma vez, abre duas."
"Para nós,
bastaria um passo ousado
na dança do sentimento."
um abraço
Mas, que maravilha. Teu nome é Ramon, certo? É o nome do meu pai e do meu avô.
ResponderExcluirA minha pretensão é uma gota no teu oceano de cotejo a esses pedaços de sonhos, que você citou aí. O' Hara, Cabral... Este último, sem dúvida, minha maior inspiração.
Só tenho a te agradecer. E sinta-se à vontade para continuar revelando a minha obra a mim mesmo. Que, em grande parte, eu deliciosamente ainda desconheço.
Um abraço.
e mesmo assim nos fazem acreditar
ResponderExcluirque vivemos num parque de diversões
dentrodabolh.blogspot.com
Adorei este teu poema e lembrei-me de um pensamento que li há muito tempo: Pegue em todos os cacos da sua vida...e tenha a coragem de começar de novo.
ResponderExcluirNo poema está ali tudo: os pequenos-grandes problemas do nosso dia a dia, as desilusões, a justiça que não chega e o desconforto que a sociedade nos oferece.
Brilhante, Amigo! Estás no bom caminho. Beijo
Graça
foda!
ResponderExcluiré sempre mais doído oque está por trás, o que pode ser subentendido...