segunda-feira, 19 de julho de 2010

Ocaso de nós.

Não gosto de nenhum
desses sabores; amargos
horrores, hilários
temores normais a todos
aqueles que, dentre
os quais me incluo,
têm aversão a tudo
o que se apresenta
sorrateiramente e, por regra,
não aparenta perigo iminente.

A simples queda recente
é um reflexo da decadência,
da impaciência apressada,
de passadas experiências
registradas nos anais
da minha existência,
calcadas em excessiva
carência e atração
por prática subversiva;
passiva auto-destruição.

Ainda bem, o tempo
corre lentamente;
a enchente de versões
nunca se esvai, se dissemina
como vírus; agride
os reais objetivos
mundanos, urbanos anseios
pós-modernos; sonhos
presos por gravatas
e incômodos ternos.

O meu negócio é jogar,
mas sei que devo parar,
pensar, passar p'ra frente;
contente, esperar
pela redenção; esconder
a emoção, a aflição
pelo presente momento;
e, sem lamento, aceitar
a implacável crueldade
da inevitável final rendição.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Um brinde.

ao João.

Tua aparente dispersão
é um traço de poética
reflexão, uma quase mítica
imagem que, apressados,
imediatistas como eu, fazem
de tua pessoa que, seja escrito,
lido, dito, é de alma boa
a toda prova, a toda nova revelação.

Tu foste o gatilho de tudo
que cá proponho;
ousaste apresentar-me
esse mundo de despretensão
(des)organizada em versos; por vezes,
desconexos desabafos cercados
de inconscientes manifestações;
lugar comum de paixões, decepções.

Se hoje exponho-me como poeta,
foi porque apareceste-me em local
e momento certos, mostraste-me
o sinuoso caminho dos sentimentos
pseudo-materializados, nada
pasteurizados, de essência real
e anormal fragrância à maioria;
íntima cachaça nossa de cada dia.

Teu andrajo é vivo em mim
enquanto escrevo; teus cigarros
também fumo; se, de hora p'ra outra,
sumo na multidão de compromissos,
torno-me ausente a quem nutro
verdadadeiro carinho, é porque
moldo-me sozinho, carente,
e pouco presente a tudo.

Não pretendo consolidar essa lógica,
física condição entre nós, sem razão
de existir; prometo-te redimir-me
de tão injustificável falta;
que as mesmas planejadas marias-
moles, num futuro próximo, ganhem pauta,
e que sejam de constante, saborosa,
e, propositalmente, inexata freqüência.

Falta-me, notadamente, tua saliente
veia artística, mas sobram-me
lembranças de um tempo
em que, juntos, conhecemos
o que acontece; onde tudo pode
parecer simples se compartilhado,
se banhado em afinco, emoção,
fumaça e até alguma distração.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Jamais.

Tô rouco de dizer, mas disse
muito pouco do que precisava;
tu ficas surda, torna-te brava
p'ra não teres que ouvir uma
palavra sequer; e não queres
responder, nem expor, a real
medida; dose imoral de partida.

Já começas gritando, encenando,
demonstrando todo teu poder
de overacting; tuas mentiras,
a mim, são inférteis, só
provocam minha ira, evocam
os pensamentos mais sombrios,
os mais vazios sentimentos.

Meu lamento é enorme, diante
deste quadro mal-pintado
de polígonos mal-traçados,
devaneios mal-sonhados, pouco
planejados e projetados no atual,
factual panorama de decepção,
muita culpa e nenhum perdão.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Tara.

Prefiro absorver-te assim, calado;
nada dentro de mim é capaz de
digerir-te, assumir-te
como te apresentas; tua (reconhecida)
culpa não te isenta de tudo aquilo
que já está feito, e a ferida,
em meu peito, jamais sarará.

Teus cabelos puramente ondulados,
dispostos sobre tua testa,
são um espelho das oscilações
de tua perturbada psiquê,
e quando fazem-se, por mágica,
química, física, mitologia, lisos,
é prudente esperar pelo pior.

Tua faceta mais faminta,
teu instinto mais sombrio
é revelado na calada da noite,
e vendetta não é o suficiente;
tua gélida e impaciente figura
tem fissura pelo promíscuo; tu
perdes o controle e mostras tua cara.

Misturam-se bem e mal
dentro de ti; nada mais
tem coerência; tua paciência
extinguiu-se; tua urgência
por saciar teus caprichos
é implacável; não és tolerável
nem mais a ti mesma...

Enfim, tu despertas.

Nada te restas, senão o desejo
por imediata reconstrução; em vão,
tu te esforças sem traçado
objetivo, somente pela vontade
de manter vivo o elo
entre o chão e o céu, o pão
e o mel do teu vil sorriso.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Alma.

Não consigo ser verdadeiro
contigo, não flui o discurso;
minha rota de incostantes palavras
desvia seu percurso para o abstrato
caminho de signos dúbios, fluidos
reflexos de uma personalidade
incompatível com a vontade
da tua alma.

Não te peço paciência, apenas
calma com essas pequenas
naturais farpas de uma escultura
que ainda não foi terminada
pelo artista imerso em cultura
e inexperiência; postura firme,
rígida nuance de ansiedade
daquele que tem tudo a perder.

Ao teu lado, espero muito
aprender; apreensivo,
sigo o rumo da prudência;
conservador que sou, protejo
minhas coisas e esqueço
da essência, raiz de todos
os nós; e percebo que somente
a sós consigo entender.